
A renovada digitalização do acesso à Psicologia e a cuidados de saúde mental traz novas oportunidades a profissionais, através da formação e supervisão à distância e da facilidade de acesso a recursos de decisão ética e deontológica, e a clientes, na facilidade de acesso a sessões online e a recursos informativos digitais. No que concerne o profissional de Psicologia, estes benefícios são acompanhados pela dificuldade de definição de um equilíbrio saudável com o recurso às tecnologias da informação, particularmente quando a título pessoal, em momentos de lazer, a utilização destes meios é já superior ao considerado adequado e saudável ou quando esse desequilíbrio surge da sobrecarga cognitiva de sessões online e reuniões back-to-back, sem pausas significativas entre tarefas.
O excesso de horas passadas online, justificadas pela possibilidade de responder a “só mais um e-mail” ou pela pressão de disponibilidade permanente, têm impacto na qualidade das intervenções realizadas e nas partilhas em contexto de reunião. Adicionalmente, a presença da prática psicológica no digital traz-nos questões do ponto de vista ético como os contornos do compromisso da confidencialidade, que devem ser adaptados ao contexto online, ou os limites de contacto com clientes (i.e., utilização de contacto pessoal do profissional para gestão de agenda). Do ponto de vista pessoal, a utilização das tecnologias de informação e da internet na carreira em demasia é um fator somado ao stress basal de um contexto de trabalho excessivamente exigente, onde a ausência de fronteiras digitais diárias contribui para sintomas compatíveis com burnout.
Se adotar estratégias de autocuidado direcionadas para a autorregulação no âmbito da definição de tarefas profissionais e designação de momentos pessoais e de lazer é fulcral para manutenção de uma carreira de sucesso, quando adicionamos o espetro do digital à prática profissional, que ocupa grande parte do dia dos profissionais, estas tornam-se centrais à prática do psicólogo, em qualquer que seja o contexto.
No fundo, há que adaptar medidas de autocuidado às ferramentas digitais utilizadas no quotidiano: realizar pausas regulares entre consultas e/ou reuniões online, ou intercalar tarefas realizadas no online com aquelas que nos é possível realizar presencialmente com colegas e/ou clientes; definir horários digitais e comunicar às pessoas que nos rodeiam tanto em contexto de trabalho como na nossa vida pessoal; e limitar a presença online fora do horário de trabalho, ao desligar as notificações num determinado período de tempo (i.e., entre as 20h e as 8h, tornando esse um momento de desconexão total do digital) ou ao criar rotinas e momentos de detox digital (i.e., definir 1 dia da semana sem conexão à internet e redes socais).
Como alternativa à adoção de hobbies digitais fora do horário de trabalho, podemos optar por atividades offline, como exercício físico, leitura ou trabalhos manuais (i.e., cerâmica, scrapbooking) ou pelo investimento na relação com pessoas, no presencial (i.e., tomar um café sem limite de tempo com amigos/família). Esta gestão permite que a disponibilidade digital do profissional se foque nos momentos considerados como obrigatórios, durante o horário de trabalho, e que seja possível priorizar momentos de presença total e de mindfulness nas pausas diárias e na vida pessoal, garantindo um modelo de equilíbrio saudável da pessoa e daqueles que a rodeiam. Cabe, assim, a cada profissional refletir sobre a sua relação com a tecnologia e os interesses que podem resultar em hobbies profícuos a uma sensação de bem-estar geral.