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Mas porque é que nunca me tinham dito isto?

Artigo por Nuno Costa

Consegues resolver X desafio científico? É possível resolver situação Y de forma ética? A estratégia Z é a melhor prática possível? Estas e outras perguntas chegam-nos a toda a hora e em todos os contextos de intervenção enquanto Psicólogos/as.  A procura incessante por respostas adequadas e soluções inovadoras para tantos desafios múltiplos é exigente. Em face destas exigências, um dos conselhos que mais cedo recebemos na nossa vida profissional é o de construir uma boa rede de apoio. Incluem-se nela pessoas que nos encorajaram, afirmam as nossas ideias e vêem aquilo que de melhor há em nós.

No entanto, tenho-me deparado com uma necessidade que vai além do apoio. Creio que temos também uma necessidade intrínseca de alguém que nos desafie e questione as nossas ideias. Para esse fim, precisamos daquilo que o Psicólogo Adam Grant (2021) chama de rede de desafiadores/as. Nesta podemos incluir pessoas a quem reconheçamos honestidade, sentido crítico e em quem confiemos. O objectivo destas/es desafiadoras/es é dizer-nos aquilo que precisamos de ouvir em vez daquilo que gostaríamos de ouvir. Entre as suas principais qualidades devem constar não só não ter medo de discordar, como saber discordar construtivamente.

Se forem como eu, poderão sentir uma pontada de nervosismo e a respiração ligeiramente mais acelerada só de pensar nesta ideia. O confronto, a discórdia e a honestidade podem assustar. Mas este medo não é muito duradouro. Depois de receber feedback construtivo as primeiras vezes dei por mim a pensar, “Mas porque é que nunca ninguém me tinha dito isto?. Mas não avanço esta proposta somente com base na experiência pessoal. Também as evidências da Ciência Psicológica corroboram que os/as Psicólogos/as com uma rede de desafiadoras/es implementam práticas mais eficazes e éticas e conseguem ser mais criativos/as, rigorosos/as e produtivos/as (Diggs-Andrews et al., 2021; Mellers et al., 2001; Van Bavel & Packer, 2021).

O confronto, a discórdia e a honestidade podem assustar. Mas este medo não é muito duradouro. Depois de receber feedback construtivo as primeiras vezes dei por mim a pensar, “Mas porque é que nunca ninguém me tinha dito isto?”

Construir uma rede de desafiadores/as é uma tarefa que requer intencionalidade e algum investimento, mas a recompensa a nível de desenvolvimento profissional é inestimável. Seguem-se quatro sugestões para criar e manter uma challenge network eficaz:

 

  • Recrutar as pessoas certas. O sucesso desta rede está inteiramente dependente das pessoas que dela fazem parte. Queremos pessoas que partilhem connosco valores fundamentais como valorização da evidência científica, honestidade intelectual e capacidade para dialogar construtivamente. Desafiadoras/es com estas características criam uma boa base para a colaboração.

 

  • Investir na diversidade. Se decidirmos que a nossa rede vai ser composta por mais do que um/a desafiador/a, podemos tirar partido de pessoas diferentes de nós, com experiências de vida diferentes e outros conhecimentos.

 

  • Comunicar com as/os desafiadores/as. De modo a convidar os/as desafiadores/as que identificámos para a nossa rede, podemos transmitir-lhes as razões pelas quais os seus contributos são valiosos. Podemos partilhar que apreciamos os seus conhecimentos numa área específica ou que apreciamos a forma como nos dão um feedback estruturado, por exemplo.

 

  • Definir o método. Se o/a(s) desafiador/a(s) aceitar(em) o nosso convite, o passo seguinte passará por definir o funcionamento da rede. Entre as decisões a tomar podemos identificar: qual o momento em que a rede deve ser activada (fase de criação de ideias ou revisão de intervenções/recursos já iniciados?), qual a forma de feedback desejada (Oral ou por escrito? Incide em alternativas ou na crítica dos nossos argumentos?) e qual a regularidade do processo (O feedback é dado em produtos avulso ou em todos?).

Tendo apresentado a minha defesa da ideia das redes de desafiadoras/es, chega agora a hora de perguntar-vos: challenge accepted?

Referências bibliográficas

Grant, A. (2021). The Power Of Knowing What You Don’t Know. EUA: Ebury Publishing.

Diggs-Andrews, K., Mayer, D. & Riggs, B. (2021). Introduction to effective mentorship for early-career research scientists. BMC Proceedings, 15(2), 1-7.

Mellers, B., Hertwig, R. & Kahneman, D. (2001). Do frequency eliminate conjunction effects? An exercise in adversarial collaboration. Psychological Science, 12(4), 269-275.

Van Bavel, J. & Packer, D. (2021). The Power of Us: Harnessing Our Shared Identities to Improve Performance, Increase Cooperation, and Promote Social Harmony. EUA: Little, Brown Spark.