Artigo por Edite Queiroz
O primeiro Regulamento de Estágios da OPP é publicado em Outubro de 2010, pouco depois do nascimento da Ordem, em Abril do mesmo ano. A partir desse momento, a realização de estágio profissional torna-se requisito obrigatório para o acesso a uma profissão até então desregulada, na qual os estudantes transitavam para o mercado de trabalho saídos de estágios curriculares com condições e duração muito diversos ou, em alguns casos, sem terem tido a oportunidade de aplicar os seus conhecimentos em contexto real.
“Não penses nunca que és apenas um Psicólogo Júnior. Tu és o Futuro.”
Embora a obrigatoriedade de realização do estágio profissional, para além de constituir uma imposição legal, viesse revestida de vantagens teóricas – começando pela uniformização das condições de acesso ao exercício autónomo em toda a Europa e culminando na possibilidade de uma experiência de trabalho num contexto concreto e supervisionado, promotor da capacidade de resolver problemas, da aquisição de novas competências e do desenvolvimento de métodos de trabalho – a novidade foi recebida a contragosto por estudantes e diplomados. Afinal, após cinco anos de estudo (acrescidos, em alguns casos, dos anos de Mestrado ou Doutoramento), impunha-se agora um ano adicional de estágio, antes de poderem propriamente trabalhar? Afinal, antes de poderem exercer a profissão dos seus sonhos, esperava-os um ano de estágio, por certo não remunerado, a somar aos meses a exercer de forma gratuita nos locais onde cumpriram os estágios curriculares? Afinal, depois de todo este caminho, era-lhes dito: Ao contrário dos que vieram antes de ti, terás de dar provas adicionais de que serás capaz? Não era justo. O estágio profissional começou, por isso, por ser encarado como um obstáculo ao acesso à profissão, um acréscimo desnecessário ao tempo de formação que adiava o exercício, representava um ano de trabalho não pago, enfim, um atraso inexplicável dos planos traçados.
Porque os resultados contam a sua própria história, os motivos que subjazem à necessidade de realização do estágio profissional são hoje amplamente aceites. As vantagens acima citadas são apenas as mais imediatas. Muitas mais foram emergindo, para benefício dos futuros profissionais, dos Psicólogos em exercício e da própria ciência psicológica.
Dez anos volvidos, não somos apenas mais, mas muito melhores. Saímos do ensino superior com uma visão mais clara do que nos espera, na certeza de que a Psicologia é um planeta de possibilidades que extravasa as clínicas, hospitais, escolas, empresas e universidades – e que em todos os lugares onde existem pessoas, um psicólogo terá, certamente, um contributo a oferecer. Desenvolvemos um olhar não apenas mais vasto sobre a Psicologia, mas também mais crítico sobre os lugares em que somos tão necessários e não estamos ainda presentes. Percebemos que o estágio profissional não é um adiamento da entrada no mercado de trabalho, mas justamente a entrada no mercado de trabalho, de alguém dotado de competências técnicas, científicas, deontológicas e de relacionamento interpessoal, que serão trabalhadas e aprimoradas ao longo de um ano de prática supervisionada. Percebemos que o trabalho de um Psicólogo Estagiário é tão precioso como o de um profissional sénior e deve, por isso, ser respeitado e remunerado. Percebemos que a entrada no mercado de trabalho não é um momento, mas um processo, que deve começar antes da conclusão da formação académica, implicar o esboço de um percurso de carreira e ser trabalhado ao longo de todo o ciclo de vida – o estágio profissional é apenas uma das múltiplas etapas desse percurso. Aprendemos que a carreira se constrói paralelamente ao percurso pessoal e de vida. Aprendemos que, para construir um percurso de carreira, é preciso conhecer os nossos interesses, aptidões, valores e preferências e avaliar como se conjugam com a profissão escolhida e os múltiplos campos de actuação que ela oferece. Aprendemos a aceitar que a mudança faz parte da vida e também nós mudaremos com o tempo – e por isso, também a carreira é algo sempre inacabado, mutável, susceptível a surpresas, desvios e transformações. Aprendemos que o emprego não está lá fora à nossa espera e que é preciso fazer acontecer. E para isso, não apenas é necessário conhecer o mercado, mas conhecer o mundo e os outros, estabelecer contactos, alimentar as redes, adquirir competências transversais. E viver. Aprendemos que para ser Psicólogo é preciso sair da caixa da Psicologia e passear pela caixa da História, da Sociologia, da Política ou da Cultura. Aprendemos também que, às vezes, o que queremos fazer ainda não foi feito, e por isso é fundamental aprender a transformar contratempos em oportunidades. Partilhamos perspectivas frescas com os nossos supervisores, contribuindo com ideias inovadoras e enriquecendo contextos de intervenção e práticas já existentes. Construímos a confiança para arriscar em áreas novas, contextos por experimentar e serviços inovadores, criando caminhos que serão trilhados por outros, dando continuamente resposta a novas exigências num mundo que todos os dias nos desafia e surpreende.
Não penses nunca que és apenas um Psicólogo Júnior. Tu és o Futuro.
Muito obrigada aos Estudantes de Psicologia e aos Psicólogos Júnior
por tudo o que me deram – e à Psicologia –
ao longo destes 10 anos.
Edite Queiroz