O crescimento do tópico da inteligência artificial em contexto laboral, as consequências, ainda ressonantes, da pandemia, e a eminente crise económica e social, conduzem a uma sensação de instabilidade no trabalho que nos faz refletir sobre as decisões de carreira tomadas até então e questionar que caminho pretendemos tomar a partir desse momento.
A sensação de instabilidade vivida pela classe trabalhadora pode ser definida como uma consequência da discrepância entre as habilidades funcionais e cognitivas de um indivíduo e a exigência do seu trabalho, que quando exacerbada, contínua e não resolvida, culmina na ameaça do posto de trabalho e, portanto, do meio de subsistência do trabalhador.
À primeira vista, e seguindo a linha de pensamento das tendências das redes sociais, esta problemática seria pouco preocupante para os trabalhadores mais jovens. Contudo, essa conclusão foge da verdade na medida em que se tem vindo a revelar que, independentemente da faixa etária, aquilo que pretendemos, enquanto trabalhadores, e mais ainda enquanto humanos, é a sensação de propósito (também) em contexto laboral.
Passamos cerca de 1/3 do nosso dia ligados ao local de trabalho, pelo que, na dificuldade de ter outro domínio da nossa vida que nos transmita um propósito, é possível utilizar as tarefas diárias como fonte de bem-estar e as relações laborais para fomentar o sentimento de pertença.
O conceito de “job crafting” define-se como uma prática de redefinição da função laboral de um trabalhador para que vá ao encontro dos seus valores, interesses e objetivos pessoais, tendo por base o reconhecimento da sua autonomia para tal. Estas alterações podem acontecer em 3 dimensões distintas:
1. Tarefas: adotar mecanismos diferenciadores na realização de tarefas que considera mais aborrecidas, tornando-as mais significativas (i.e., adotar um novo método de organização do calendário ou e-mail);
2. Relações: modificar comportamentos e interações com colegas, no sentido do que mais lhe apraz (i.e., estabelecer uma rede de contactos com hobbies semelhantes) e que potencialize um ambiente de trabalho positivo;
3. Cognição: restruturar o significado do trabalho e da sua perceção do mesmo, para que possa encontrar propósito pessoal durante a jornada laboral (i.e., preferir organizações cuja missão se alinhe com os valores e morais pessoais).
Enquanto Psicólogos, o nosso trabalho vai além da prática interpessoal, per se, e implica um processo de formação contínua e de desenvolvimento pessoal, num caminho sempre crescente, face às constantes evoluções da própria Psicologia. Assim, importa refletir quais são os fatores pessoais que fazem sentido interpolar na prática profissional, por forma a encantar consistentemente, em tom de motivação, o profissional que seremos amanhã.
Para que possa tirar melhor partido destas estratégias, importa que as mesmas sejam aplicadas durante o expediente laboral, e não na conclusão de tarefas em regime pós-laboral, mascarado de tempo pessoal – este, que deve ser respeitado para que se consiga atingir um balanço positivo entre o trabalho e a vida pessoal. Adicionalmente, a realização de intervalos durante o dia de trabalho é também benéfica ao bem-estar e à saúde mental dos trabalhadores.