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Fazer o que se gosta ou gostar do que se faz…

Artigo por Sofia Cardoso

Que influência na realização profissional?

É comum pensar-se que o mais importante é “fazer o que se gosta”, já que de outra forma não é possível ser-se feliz no trabalho ou sentir-se realizado/a profissionalmente.

Mas será que é mesmo assim?…

Para muitos, “fazer o que se gosta” significa exercer a profissão com que sempre se sonhou e para a qual se estudou. Este mind set assenta em ideias como: “Só existe uma área profissional na qual me poderei sentir realizado/a”; “Para mim esta área profissional só tem pontos positivos e, por isso, vou valorizar tudo o que com ela se relacione”; “Não terei problemas, nem sentirei cansaço, stress ou emoções negativas trabalhando nesta área”; “Se não conseguir trabalhar no “meu” domínio, dificilmente haverá outra área profissional que me proporcione igual satisfação”.

Mas, muitas vezes, por contingências de vida ou do próprio mercado de trabalho, nem sempre é possível conseguir-se oportunidades na área idealizada, para a qual se estudou, se tem talento e vocação, colocando-se a necessidade de procurar alternativas.

E, quando tal acontece, vêm ao de cima sentimentos de angústia, frustração e desmotivação relativamente ao que se faz profissionalmente, acabando por se entrar num paradigma totalmente reactivo e, sem querer, é-se “refém” dessas circunstâncias de vida e de uma idealização profissional não concretizada. O que por si acaba por determinar a forma de cada um/a se sentir, colocando em causa o seu presente e até o seu futuro.

Para além de que, quando a relação pessoa/trabalho é mediada por significados negativos, incorre-se numa probabilidade enorme de desenvolver riscos psicossociais, nomeadamente, stresse ocupacional ou síndrome de burnout.

O que se verifica é que, em muitos casos, se ignora não só, que podem existir outras áreas profissionais em que se pode revelar um forte potencial para se ser bem-sucedido/a, como, também, que se pode aprender a gostar de uma actividade profissional que não se imaginaria vir a exercer, mas, que, dentro das possibilidades existentes, se aceita realizar.

As pessoas que “gostam do que fazem” aprendem a apreciar o seu trabalho ou área profissional, independentemente de outras aptidões que tenham e de outra profissão ou área em que pudessem ter exercido. Revelam, por isso, uma atitude proactiva. Trabalham para ser o mais competentes possível, constroem um sentido positivo para o que fazem, aprendem a gostar genuinamente da sua função ou da área que exercem, retiram prazer da mesma e, como consequência, sentem-se auto-motivadas. No fundo, constroem um propósito.

Neste caso, o mind set é um pouco diferente, e assenta em ideias como: “Há várias áreas nas quais me poderei sentir auto-realizado/a”; “Todas as atividades profissionais têm aspetos gratificantes e aspetos desagradáveis, pelo que nunca se gosta de tudo, mesmo quando se está na área escolhida e em que se idealizou trabalhar”; “Teria sempre problemas, momentos de cansaço, stress e emoções negativas, qualquer que fosse a área em que trabalhasse”; “Posso desenvolver-me nesta atividade profissional e obter um enorme prazer e compensação, apesar de nunca ter anteriormente equacionado trabalhar neste domínio”; “É da minha responsabilidade desenvolver as minhas competências, aprender a gostar do trabalho que realizo, dando-lhe um propósito”.

Quando se “faz o que se gosta”, reage-se a um interesse intrínseco (e, nesse sentido, é-se reativo). Quando se “gosta do que se faz, é-se proactivo na construção desse gostar. A proactividade, neste sentido, é exercida através da nossa escolha e da gestão das emoções. E não se deve ser “escravo das emoções”, pois pode-se sempre influenciá-las através daquilo que se escolhe.”

Alguém apenas só faz aquilo que gosta?! Não. Quem considera o contrário acaba por ter, em minha opinião, uma visão um pouco “romântica” da questão, pois para se fazer o que se gosta, tem de se fazer um sem número de outras coisas de que não se gosta.

Quando se “faz o que se gosta”, reage-se a um interesse intrínseco (e, nesse sentido, é-se reativo). Quando se “gosta do que se faz”, é-se proactivo na construção desse gostar. A proactividade, neste sentido, é exercida através da nossa escolha e da gestão das emoções. E não se deve ser “escravo das emoções”, pois pode-se sempre influenciá-las através daquilo que se escolhe.

Para se “gostar do que se faz”, é importante, também, saber identificar exactamente o que se gosta, sublimando essa tarefa/atividade, alinhando isso com os seus próprios valores individuais (importância do autoconhecimento) e é importante ser-se capaz de gerir tudo o que não se gosta, minimizando o seu impacto.

Se se gostar muito de um determinado aspecto daquilo que se faz profissionalmente, deve-se potenciar “isso”, desenvolver mais competências para aprimorar “isso” que se faz, procurar ganhar condições para fazer mais “disso”, e menos do resto. É dessa forma que se constrói a auto-motivação.

Existem estudos  que apontam para o facto de que, apesar do reconhecimento de aspectos negativos inerentes a um determinado trabalho, a maioria das pessoas continuaria a realizá-lo mesmo sem ser apenas pela necessidade económica, o que evidencia a percepção positiva que fazem do mesmo. E entre as justificações associadas a essa percepção destacam-se, nomeadamente, o anseio pelo desenvolvimento/aperfeiçoamento de competências no que realizam, bem como a atribuição de um “propósito” ao que realizam.

A realização profissional depende, portanto, do sentido e do significado que cada um/a atribui ao trabalho que realiza e de um conjunto de factores, muitos deles totalmente controlados por cada um/a.

A realização profissional pode não residir exclusivamente no “fazer o que se gosta” aliado ao desejo de alcançar determinados objetivos de carreira, ou conseguir a promoção ou o cargo de destaque tão desejado, ou de se atingir as condições salariais ambiciosamente pretendidas.

A realização profissional pode passar simplesmente por “gostar do que se faz”, construindo um sentido positivo para essa actividade, permitindo, assim, a cada um/a desenvolver o seu próprio padrão de qualidade de vida e a sua própria satisfação/ felicidade no trabalho.