Artigo por Joana Almeida Monteiro
É uma das recomendações que ouvimos na infância: “Não fales com desconhecidos”, dizem-nos. No entanto, ao contrário dessa regra mal explicada, lá nos incentivam a ir abordando o senhor do talho, do café, a cumprimentar os vizinhos (mesmo aqueles que não conhecemos), a fazer amigos na turma nova. Devemos ou não falar com desconhecidos?
No âmbito da construção da carreira tal é inevitável. Desconhecemos quem possa ser o nosso futuro empregador, os nossos próximos colegas de trabalho. Passamos a ter de contactar cada vez mais frequentemente com pessoas que não conhecemos (e que não nos conhecem). Preocupamo-nos com a impressão que deixamos, com a marca pessoal que transmitimos.
“Numa era em que a informação sobre qualquer coisa está disponível à distância de um clique, nem por isso sempre é mais fácil encontrar o que procuramos […] Tal como há vagas que nunca chegam a estar num anúncio/oferta de emprego, também há informação valiosa que não está escrita em mais lado nenhum.”
Numa era em que a informação sobre qualquer coisa está disponível à distância de um clique, nem por isso sempre é mais fácil encontrar o que procuramos. Abordar desconhecidos é mais uma forma de abordar o desconhecido. Falar com pessoas pode ser uma das mais poderosas ferramentas de carreira, na medida em que, por exemplo, nos permite saber mais sobre coisas em relação às quais não encontramos informação em mais lado nenhum. Tal como há vagas que nunca chegam a estar num anúncio/oferta de emprego, também há informação valiosa que não está escrita em mais lado nenhum.
Partilho dois exemplos – um em que abordei desconhecidos, outro em que fui eu abordada. São somente isso, exemplos de como facilmente podemos partilhar e obter informação útil para as nossas carreiras.
No âmbito da minha prática em aconselhamento vocacional de jovens uma vez apoiei um rapaz que estava no ensino secundário e que pretendia, no futuro, desenvolver videojogos. O plano era consonante com os seus interesses e aptidões. O problema era que eu, para o melhor poder apoiar, teria de perceber melhor esse caminho. Imaginei que para que um videojogo existir haja um grande conjunto de profissionais, com diferentes competências e áreas de formação (design, programação, guionistas, etc.). Só tinha de encontrar forma de saber mais sobre o tema. Pesquisei no LinkedIn até encontrar o responsável por uma empresa portuguesa produtora de videojogos. Preparei uma mensagem que me apresentava e explicava o porquê da minha abordagem, e que questões tinha sobre uma área profissional que conhecia muito mal. “Uma não-resposta é o que tenho garantido”, pensei. O meu esforço foi recompensado – recebi uma resposta relativamente rápida, com todos os esclarecimentos que precisava, partilhada com todo o gosto. Gosto de acreditar que também naquele contacto dei a conhecer o trabalho que desenvolvia como Psicóloga.
Há uns meses recebi uma mensagem no LinkedIn, por parte de uma Psicóloga que, querendo trabalhar em áreas parecidas com a minha, me contactava a pedir uma entrevista exploratória. Estava a fazê-lo com um conjunto de profissionais que encontrou nesta rede social profissional. Fiquei surpreendida com o contacto, não porque não achasse incrível que alguém pusesse em prática o que na teoria sempre ouvi (e fiz) como uma recomendação no desenvolvimento de carreira (“Fazer entrevista exploratória com profissionais”), mas porque nunca tinha visto tal coisa acontecer. E realmente facilmente encontrei tempo na agenda para uma reunião Skype, e com todo o gosto partilhei a minha visão do sector, prometi (e cumpri!) partilhar materiais e artigos, trocámos impressões sobre o mercado de trabalho e o futuro da Psicologia Vocacional e do Desenvolvimento de Carreira.
São meramente exemplos, mas creio que demonstram como o LinkedIn é uma ferramenta que pode ser utilizada bem mais do que para coleccionarmos conexões. Aliás, as verdadeiras conexões não são os convites enviados indiscriminadamente, são mesmo os contactos pessoais em que deixamos a nossa marca e em que nos tornamos conscientes de quem é o profissional com quem estamos a criar rede.
Deixo, por isso, o desafio: quem é o profissional com quem gostariam de falar, trocar mensagens ou combinar uma videochamada? O que gostaria de saber sobre a sua área de trabalho? Sobre a empresa onde trabalha? Sobre a formação X ou Y que a pessoa frequentou?
Transformemos a recomendação da nossa infância para algo mais próximo de “Fala com desconhecidos, de forma intencional e educada, e poderás deixar a tua marca e em troca desenvolver uma relação social profissional em que aprendes”.